terça-feira, 22 de maio de 2012

Estratégias de Geoconservação



Geoconservation is giving “life” to rocks,
 is telling stories about our planet to make people to understand and love them.
Alexandru Andrăşanu, Sinaia, 2012



Portas de Ródão - Passage of the Tagus at Villa-Velha (Westall, 1823)

Mutos locais com interesse geológico foram destruídos, ocultados ou irreversivelmente danificados, devido à alteração do uso da terra para a urbanização e a agricultura. Muitos desses locais poderiam ter sido preservados, se anteriormente tivesse existido uma inventariação que denunciasse a sua importância.

A geoconservação surge como uma necessidade de conservar e gerir o patrimônio geológico e os processos naturais associados. “Tem o objetivo de preservar a diversidade natural (geodiversidade) de significativos aspetos e processos geológicos (substratos), geomorfológicos (formas da paisagem) e do solo, mantendo a evolução natural (velocidade e intensidade) desses aspetos e processos” Brilha, 20015). A geoconservação contribui para uma abordagem holística da conservação da natureza e oferece novas ferramentas no uso sustentável dos recursos naturais, contribuindo para os objetivos da Agenda 21 (Andrăşanu, 2012). A geoconservação combina quatro conceitos: avaliação da geodiversidade (geossítios, património geológico, etc.), geoeducação, geoturismo e geoparques.

Desde a década 70 do século passado que apareceram vários organismos interessados na conservação do património geológico. Porém, aponta-se as primeiras referências e desenvolvimento de estratégias de geoconservação, à região da Tasmânia, na Austrália, a partir da elaboração de um documento intitulado “Estratégias de Geoconservação da Natureza”. O conceito esteve até 1991 geralmente subordinado a outras atividades de conservação da natureza. A partir desse ano foram desenvolvidos diversos conceitos e métodos de geoconservação (Andrăşanu, 2012), com contribuição das seguintes organizações, eventos e legislação: ProGEO/WG; Digne Declaration – Declaração Internacional dos Direitos à Memória da Terra, 1991; Rio Conference, 1992; criação e desenvolvimento do European Network Geoparks, 1997-2000; criação do Global Geoparks Network, 2000-2004; CE Recommendation 3/2004 (Geological heritage); IUCN (Almeria, 2007). É de salientar que a partir de 2000, os conceitos geoconservação e geoparques foram globalizados e a Declaração Internacional dos Direitos à Memória da Terra é um excelente instrumento para a geoconservação. Transcreve-se a seguir o seu conteúdo:

Declaração Internacional dos Direitos à Memória da Terra
(Digne, Fr., 1991 –1º Simpósio Internacional sobre Protecção do Património Geológico)

1 - Assim como cada vida humana é considerada única, chegou a altura de reconhecer, também, o carácter único da Terra.
 2 - É a Terra que nos suporta. Estamos todos ligados à Terra e ela é a ligação entre nós todos.
 3 - A Terra, com 4500 milhões de anos de idade, é o berço da vida, da renovação e das metamorfoses dos seres vivos. A sua larga evolução, a sua lenta maturação, deram forma ao ambiente em que vivemos.
 4 - A nossa história e a história da Terra estão intimamente ligadas. As suas origens são as nossas origens. A sua história é a nossa história e o seu futuro será o nosso futuro.
 5 - A face da Terra, a sua forma, são o nosso ambiente. Este ambiente é diferente do de ontem e será diferente do de amanhã. Não somos mais que um dos momentos da Terra; não somos finalidade, mas sim passagem.
 6 - Assim como uma árvore guarda a memória do seu crescimento e da sua vida no seu tronco, também a Terra conserva a memória do seu passado, registada em profundidade ou a superfície, nas rochas, nos fósseis e nas paisagens, registo esse que pode ser lido e traduzido.
 7 - Os homens sempre tiveram a preocupação em proteger o memorial do seu passado, ou seja, o seu património cultural. Só há pouco tempo se começou a proteger o ambiente imediato, o nosso património natural. O passado da Terra não é menos importante que o passado dos seres humanos. Chegou o tempo de aprendermos a protegê-lo e protegendo-o aprenderemos a conhecer o passado da Terra, esse livro escrito antes do nosso advento e que é o património geológico.
 8 - Nós e a Terra compartilhamos uma herança comum. Cada homem, cada governo não é mais do que o depositário desse património. Cada um de nós deve compreender que qualquer depredação é uma mutilação, uma destruição, uma perda irremediável. Todas as formas do desenvolvimento devem, assim, ter em conta o valor e a singularidade desse património.
 9 - Os participantes do 1.° Simpósio Internacional sobre a Proteção do Património Geológico, que incluiu mais de uma centena de especialistas de 30 países diferentes, pedem a todas as autoridades nacionais e internacionais que tenham em consideração e que protejam o património geológico, através de todas as necessárias medidas legais, financeiras e organizacionais.
 (Tradução de Professor Doutor Miguel M. Ramalho)

Portugal tem vindo a inventariar o seu riquíssimo patrimônio geológico, com o levantamento e classificação de elementos da geodiversidade, quer a nível isolado, quer inseridos em geoparques. Atualmente o país já conta com três geoparques - Naturtejo da Meseta Meridional, Arouca Geopark e Açores e encontram-se dois a preparar candidatura – em Macedo de Cavaleiros e Porto Santo na Madeira. Ainda longe do desejável, Portugal apresenta algumas iniciativas educativas em relação à geoconservação, que estão inseridas em projetos de educação ambiental não-formal, dentro das atividades dos geoparques ou no programa “Geologia no Verão”, sob responsabilidade da Ciência Viva, da Agência Nacional para Cultura Científica e Tecnológica. Outra iniciativa interessante para o caso é o curso de Mestrado em Patrimônio Geológico e Geoconservação, criado em 2005, pela Universidade do Minho, e que conta como objetivos: contribuir para o incremento da educação para a sustentabilidade, através do reforço das competências de docentes dos ensinos básico e secundário das áreas das Ciências Naturais e da Geografia; permitir a troca de experiências de ações concretas de Geoconservação em desenvolvimento em áreas protegidas nacionais e estrangeiras; possibilitar o desenvolvimento de trabalhos de investigação e de projeto no âmbito da Geoconservação que contribuam para o melhor conhecimento do património geológico e que tenham um real impacto na gestão de áreas com interesse patrimonial, etc.

Portas de Ródão

As estratégias de geoconservação de um geossítio incluem uma série de procedimentos, resumidos no seguinte esquema:




A inventariação dos geossítios passa pelo levantamento sistemático da área, para identificar os diversos tipos de ocorrência presentes, que inclui a tipologia dos elementos da geodiversidade a inventariar, a sua localização geográfica, o registo fotográfico e a caracterização através do preenchimento da ficha de campo respetiva. Serão tidos em conta os critérios intrínsecos do geossítio, os critérios relacionados com o uso potencial do geossítio e os critérios relacionados com a necessidade de proteção do geossítio, quantificados com base numa escala crescente de 1 a 5. Os primeiros contam a abundância/raridade, extensão, grau de conhecimento científico, utilidade como modelo para ilustração de processos geológicos, diversidade de elementos de interesse, local-tipo, associação com elementos de índole cultural, associação com outros elementos do meio natural e estado de conservação. Os segundos fazem uma análise sobre as potencialidades de realização de atividades científicas, pedagógicas, turísticas e recreativas; as condições de observação, acessibilidade e colheita de elementos geológicos; a proximidade de povoações, número de habitantes e condições socioeconómicas. Os critérios relacionados com a proteção do elemento consideram a situação atual, fragilidade, as ameaças atuais ou potenciais, o regime de propriedade, o valor dos terrenos e o interesse para a exploração mineira. 

Os processos de classificação terão de estar em sintonia com a legislação existente e as propostas poderão estar inseridas em âmbitos nacional, regional, local e municipal. Pode consultar a legislação referente a estes processos em:

A conservação de geossítios deverá ser orientada para manter a integridade física do geossítio e paralelamente assegurar acessibilidade ao público.  

A valorização e a divulgação do património geológico realiza-se com um conjunto das ações de informação e interpretação que vão ajudar o público a reconhecer o valor dos geossítios, em conjunto com o restante património natural e cultural, nomeadamente centros de interpretação, percursos e roteiros turísticos, painéis interpretativos, folhetos, Internet, etc.

A monitorização visa estudar a capacidade de carga do local, definir ações de manutenção e criar de estratégias para quantificar a perda da sua relevância ao longo do tempo.



O documentário que se segue retrata bem o conjunto de aspetos geológicos, geomorfológicos e culturais de um geoparque. Neste caso trata-se do geoparque Naturtejo da Meseta Meridional:





Bibliografia:

Agência Nacional para a Cultura científica de Tecnológica. Ciência Viva [consultado em 21 de Maio de 2012 no endereço: http://www.cienciaviva.pt/home/]

Andrăşanu, A. 2012. Geoconservation Geoparks. Conferência em Sinaia. University of Bucharest, Romania.


Brilha, J. 2005. Património Geológico e Geoconservação – A Conservação da Natureza na sua Vertente Geológica. Palimage. Imagem Palavra. Braga.



Brilha, J. 2010. Enquadramento Legal de Suporte à Proteção do Património Geológico em Portugal. Ciências Geológicas – Ensino e Investigação e sua História. Volume II, Cap. IV – Geologia e Património Natural (Geodiversidade).



Brilha, J. 2012. Geodiversity, geoconservation and sustainable development. Conferência em Sinaia. Earth Sciences Department University of Minho. Braga. Portugal.


Cunha, L. Estratégias de geoconservação [Consultado em 21 de Maio de 2012 no endereço: https://woc.uc.pt/fluc/getFile.do?tipo=2&id=7572]

Geoconservation.com [consultado em 21 de Maio de 2012 no endereço:

ProGEO [consultado em 21 de Maio de 2012 no endereço: http://www.progeo.se/index.html]

Universidade do Minho. Mestrado em Património Geológico e Geoconservação [consultado em 21 de Maio de 2012 no endereço: http://www.dct.uminho.pt/mest/pgg/index_pgg.html]

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